Versos mudos...



Mais uma vez as lágrimas manchavam a carta que ele havia escrito sem jeito, um pouco previsível demais, mas que para ela era algo único, com o mais nobre dos sentimentos ali, estampado, para um tempo que seria eterno em sua memória. Seus olhos tentavam mudar o foco da sua atenção, totalmente em vão já que as doses de Tequila a mais deixavam transbordar todas as emoções guardadas e jogadas no fundo daquele baú.
Seus olhos verdes claros, famosos pela capacidade de consumir mais álcool que pessoas de olhos escuros, começaram a procurar as frases já decoradas, como dizia sua irmã "de cor e salteado", e aquela lembrança a fez ficar um pouco pensativa demais. Ela tinha tentado de tudo, não queria mais lembrar, tentava de todas as formas dizer para si que eles não iriam completar os versos mudos e perguntas não respondidas que tomavam conta de todas as ruas de sua mente em dias como estes, onde a saudade chegava a esmagar seu coração e estômago.
"Ontem eu te vi chorando menina. Abraçada ao seu gigante urso que você deu meu nome como apelido, fiquei imaginando o que estaria acontecendo com você e fui conversar com sua irmã. Foi uma experiência tão rápida, fria e cruel e já saquei o que havia acontecido. Tentei acalma-la, você sabe como ela é agitada e quando está com raiva sai de baixo."
As lágrimas escorriam cada vez mais facilmente, seus dedos tremiam procurando explicações nas entrelinhas, alguma bobagem que ela tivesse deixado passar, algo que a fizesse sentir-se melhor.
"Mas nem tudo saiu como planejado, ela chorava muito, gritava, soluçava. Ela sentia tua falta, então decidi dirigir com ela por aí, só para ver se conseguia amenizar as coisas entre vocês. Eu sinto muito, Julia. Eu preciso do seu perdão, eu não sei quanto tempo mais eu vou conseguir ficar aqui nessa cama, vou me sentir culpado cada segundo de vida que eu ainda tenho. Mas ela não parava... Desculpa-me."
Julia olhou para o relógio que ficava em frente a sua cama, Taísa havia dado a ela no último aniversário que comemoraram juntas, eram quase duas da manhã, pegou as chaves do carro, o casaco que estava jogado no sofá e saiu. Enquanto dirigia ao hospital onde Lucas estava internado, pensou nas frases horríveis que havia falado para sua irmã horas antes do terrível acidente que tirara sua vida.
Estacionou o carro de qualquer jeito e subiu para o quarto 402, onde estava Lucas. Parou, pensou um pouco, fez um gesto para girar a maçaneta, mas desistiu, pensou em voltar para o carro. Mas ela precisava falar com Lucas. Então decidiu. Entrou no quarto. Ele estava dormindo, vários fios e tubos estavam 'presos' ao seu corpo, "Isso é errado" pensou ela e quando já estava chegando a porta uma voz fraca vindo do outro lado do quarto se revelou:
- Você veio.
- Ahn.. Desculpa, não queria te acordar. - Seus olhos agora miravam o chão cinza.
- Tudo bem, eu não estava dormindo. 
- Como você está?
- Não muito bem.
-Hum...
Ficaram em silêncio durante alguns segundos. Então Julia chegou mais perto de Lucas, pegou sua mão, olhou os seus olhos negros que hoje se mostrava tão distante e antes que ela pudesse dizer o que tinha ensaiado, ele disse:
- Desculpa Julia. - Sua voz cada vez mais fraca, fez com que Julia apertasse mais forte sua mão.
Lucas olhou uma última vez em seus olhos verdes claros e simplesmente se foi, sem um adeus, sem esperar seu pedido de desculpas... Sentindo as lágrimas queimarem seu rosto ela falou a única coisa que queria ter dito para ele e para sua irmã:
- Eu sinto muito.


Rua Lins 

Comentários

  1. Wow história muito boa, principalmente o finzinho q mexeu comigo, otima história mesmo parabens anjo x]

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